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Audiência Pública discute enfrentamento à violência física e psicológica contra crianças e adolescentes

por Patrícia Drummond publicado 26/06/2019 11h50, última modificação 26/06/2019 14h45
Audiência Pública discute enfrentamento à violência física e psicológica contra crianças e adolescentes

Foto: Marcelo do Vale

A vereadora Dra.Cristina (PSDB) promoveu nesta terça-feira (25) Audiência Pública para discutir, com profissionais da saúde, militantes contra a violência doméstica e conselheiros tutelares, o andamento do projeto de lei nº 2019/00241, que institui, em Goiânia, a Semana Municipal de Enfrentamento à Violência Física e Psicológica contra a Criança e o Adolescente – a cada ano, na semana do dia 26 de junho. A propositura tem como base a lei federal conhecida como Lei Menino Bernardo, que visa proibir o uso de castigos físicos ou tratamentos cruéis e degradantes na educação de crianças e adolescentes. 

O nome do menino Bernardo Boldrini – assassinado em 2014 no Estado do Paraná, aos 11 anos de idade, por superdosagem do medicamento Midazolam, pelo pai e pela madrasta - foi adotado pelos deputados durante a tramitação do projeto de lei 7672/2010 no Congresso Nacional. “Por se tratar de um ambiente economicamente melhor, ninguém fez nada, à época, apesar de todos os sinais. Bernardo pediu socorro, assim como pedem tantas crianças e adolescentes. Precisamos reconhecer estes sinais”, argumenta a vereadora Dra.Cristina, sublinhando que sua proposta é contribuir, com o projeto, para este “alerta” também em nível municipal.

Atualmente o PL 2019/00241, de autoria da parlamentar goianiense, está em tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJ) da Câmara, e, em seguida, após os pareceres técnicos, deverá seguir para Comissão Temática da Casa, indo, na sequência, para discussão em Plenário. “Uma, dentre as muitas lições que nos deixou a grande mulher que foi Zilda Arns, que tive o imenso prazer de conhecer, está resumida em uma única frase: Quem bate para educar, ensina a bater. Este é o princípio do nosso projeto”, acrescentou Dra.Cristina. 

Maria Aparecida Alves da Silva, militante que participou ativamente do processo de aprovação da Lei Menino Bernardo em nível federal, explicou detalhes de todo o processo, das dificuldades enfrentadas, das conquistas, e 

lembrou que o tema também motivou a Lei Estadual 20.325, de 7 de novembro de 2018, instituindo, em Goiás, o marco de enfrentamento à violência física e psicológica contra crianças e adolescentes. 

“Nosso Estado é sempre citado por sair na frente; são 16 dias em nosso calendário de ações e atividades em prol de crianças e adolescentes sem voz, vítimas de violência”, destacou. “Sairemos na frente também em Goiânia”, completou, ao agradecer a vereadora Dra.Cristina por ter acatado – na Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara, a qual preside - a sugestão para a apresentação da proposta também na esfera do Município.  

Números

Representante do Núcleo de Prevenção às Violências e Promoção da Saúde da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), Marta Maria Alves da Silva levou à Audiência Pública números recentes sobre a violência contra crianças e adolescentes (na faixa etária de zero a 19 anos de idade) na Capital. Segundo ela, de um total de 2.247 notificações de violência registradas nas unidades de saúde, 1.377 (61,3%) envolveram residentes em Goiânia e 48% correspondem a crianças e adolescentes (657 notificações). 

A violência física, nessa faixa etária, corresponde ao segundo tipo mais notificado, com 25% de notificações em menores de 20 anos, seguida da violência sexual, com 22,1%. Casos de negligência lideram o ranking, com 26,8%. De acordo com os dados apresentados, a violência física em crianças (menores de 10 anos) do sexo masculino é a segunda mais notificada no Município; já entre os adolescentes (na faixa etária de 10 a 19 anos), a violência física é a primeira notificada. 

Ainda conforme as estatísticas da SMS, 43,6% das violências contra crianças e adolescentes são causadas por familiares, envolvendo pessoas bem próximas das vítimas, como pai, mãe, madrasta, padrasto ou irmãos. A força corporal/espancamento está presente em 34% dos casos; o uso de arma de fogo, em 24%. Para 55% das vítimas menores de 20 anos do sexo masculino, há repetição de violência dentre as notificações de violência física; o mesmo ocorre para 45% das vítimas do sexo feminino, na mesma faixa etária.

“São situações que exigem muita atenção, que, certamente, ocorrem com maior frequência e que nem sempre chegam a ser notificadas. Essas crianças e adolescentes não podem ser apenas estatísticas, não podem ser sempre invisíveis; precisamos, sim, estar sempre vigilantes, em uma rede que esteja realmente integrada”, pontuou a representante da SMS, Marta Alves. 

Ao final de sua fala, Marta recordou o caso do garotinho Bruno Diogo Dias Ferreira, de apenas dois anos, morto em 2017, no Setor Real Conquista. Ele foi assassinado e estuprado pelo namorado da mãe – que confessou os crimes – com a conivência dela. Foi após receber o laudo do Instituto Médico Legal, que mostrava que Bruno Diogo tinha hematomas por todo o corpo, inclusive no ânus e no pênis, que agentes da Delegacia de Investigações de Homicídios (DIH), passaram a investigar o casal - os dois levaram a criança, já morta, para uma unidade pública de saúde do bairro. Na ocasião, afirmaram que o garoto teria morrido após passar mal em casa. 

Estresse tóxico

Neuropediatra e psiquiatra infanto-juvenil, Maria das Graças Brasil, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG) e do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), ressaltou que, para além da violência física, outros eventos podem ser traumáticos para crianças e adolescentes, com consequências devastadoras na vida adulta. 

Caso da negligência, que se caracteriza pela falha de seus cuidadores ou responsáveis em salvaguardar a saúde, segurança e bem-estar da criança; e dos maus-tratos emocionais ou psicológicos, que são formas de hostilidade verbal crônica ao menor por parte de qualquer adulto com a finalidade de atemorizar ou humilhar, como insultos, depreciações, críticas ou ameaças e abandono.

“A exposição a ambientes estressantes na infância precoce pode causar o que chamamos de estresse tóxico, uma condição que é fruto da exposição severa e frequente ou prolongada a adversidades no início da vida, como abuso, negligência e abandono”, explicou a especialista. “Nesses casos, o estresse tóxico pode levar a patologias como obesidade, doença cardíaca, diabetes e doenças mentais”, alertou. 

Segundo Maria das Graças Brasil, maus-tratos físicos em meninos podem gerar prejuízos cognitivos, motores e linguagem, além de déficit de atenção e agressividade. Já as meninas que sofrem abusos sexuais terão prejuízos cognitivos e emocionais. Em ambos os casos, conforme afirma a médica, estudos apontam que há aumento do risco de suicídio.