Em audiência, entidades da área de saúde criticam oferta de cursos superiores a distância
Vários representantes de entidades ligadas à área da saúde vieram à Câmara Municipal de Goiânia para discutir, numa audiência proposta pela vereadora Cristina Lopes (PSDB), a crescente autorização de cursos superiores de ensino a distância (EAD).
Os cursos como maior criação de vagas são Serviço Social, Enfermagem e Educação Física. Do ano 2000 para cá, o número de vagas saltaram de 2 mil para 1,7 milhões, com crescimento mais expressivo nos últimos cinco anos.
Edgar Garcez Júnior, que é coordenador do Fórum dos Conselhos Federais da Área de Saúde, criticou a qualidade dos cursos e dos profissionais formados, argumentando que a maioria dos cursos a distância oferecidos na área da saúde são essencialmente teóricos com poucos exercícios práticos e contato humano, já que toda a transmissão de conteúdo é feita por meio de textos, vídeos, áudios e trocas de mensagens entre alunos e professores em ferramentas de chat. Esses cursos também não observam as características e peculiaridades regionais no material didático, já que é feito para uso em todo o país.
“O fórum não é contra o EAD, pelo contrário, achamos ele fantástico para a educação continuada. Mas, nós o apoiamos desde que sirva como uma ferramenta, não como uma modalidade de ensino, como vem sendo praticado.” Ele defendeu que a carga horária a distância dos cursos na área da saúde esteja limitada a 20% do total – regra definida pelo Ministério da Educação (MEC) para os cursos semipresenciais – e que a carga horária total desses cursos seja igual dos presenciais.
“Estamos tentando junto à Câmara dos Deputados e o Senado aprovar uma lei que proíba a criação de cursos de ensino a distância na área da saúde, mas vendo tendo pouca adesão dos parlamentares devido ao forte poder das grandes instituições de ensino”, disse.
O coordenador disse ainda que o empregador que contrata os profissionais formados por EAD, sem saber, já que a legislação proíbe a especificação no diploma, muitas vezes precisa perder tempo e dinheiro treinando essas pessoas porque não tiveram a instrução adequada durante o curso. Além disso, o excesso de demanda e o “rebaixamento” na qualidade de ensino irão saturar o mercado de trabalho, forçando os profissionais a aceitar ofertas de trabalho com salários mais precários.
“É impossível que cursos não presenciais nessa área formem bons profissionais porque já não basta a falta de aulas em laboratórios, falta também a convivência prática em equipe, o aprendizado ocorre também pelo contato, pelo olhar, pelo gesto dos professores, outros colegas e de pacientes, durante o estágio”, disse Cristina Lopes, que é graduada em Educação Física e Fisioterapia. Para ela, o crescimento do EAD é fruto do forte lobby exercido pelas grandes instituições que detêm algum poder econômico.
A presidente do Conselho Regional de Enfermagem (Coren-GO), Ivete Santos Barreto, denunciou que instituições de ensino que oferecem EAD muitas vezes atuam de forma irregular, sem a infraestrutura mínima exigida pelo MEC, como laboratórios de anatomia, bioquímica, fisiologia, entre outros, além de microscópios, estufas e insumos. Faltam também bibliotecas e controles que comprovem a supervisão dos estágios dos alunos. “Foi constatado que as aulas práticas representam apenas 7,79% da carga horária total dos cursos, estando em desacordo ao que preceitua a legislação, que exige mínimo de quatro mil horas e cinco anos de integralização”.
Para ela, Goiás não precisa de novas vagas de cursos de enfermagem, pois já existem o suficiente nos cursos presenciais e muitas delas estão ociosas. “Semestralmente, registramos cerca de 800 novos enfermeiros no estado. A oferta de cursos como está vai provocar um inchaço no mercado de trabalho no médio e longo prazo”.
Ítalo Machado, que representou o Conselho Estadual de Educação em Goiás, disse que o estado vem fazendo o monitoramento das instituições que oferecem cursos EAD. “Posso garantir a todos que o processo de autorização para funcionamento é precedido de uma avaliação in loco, que verifica as reais condições de funcionamento das instituições e não é raro nós indeferirmos processos e caçar autorizações nos processos de renovação por falta de condições estruturais e de recursos humanos”.
Disse ainda que os cursos de instituições que estão em Goiás passam por “severa” análise até serem autorizados, mas que polos de cursos aprovados em outros estados acabam não tendo o mesmo critério. “O máximo que podemos fazer é verificar se as condições de funcionamento do polo são satisfatórias e mesmo assim temos rejeitado a autorização de muitos desses polos”. Ele deu o exemplo de uma instituição do Rio Grande do Sul, que recentemente teve a autorização caçada por problemas no processo de ingresso de alunos e por expedição de diplomas em tempo menor que o previsto na carga horária.